Deficientes visuais coordenam programa de TV

  Notícia publicada na edição de 23/02/2013 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 002 do caderno C
 Maíra Fernandes

Acessibilidade e inclusão estarão na pauta; toda a equipe de produção, incluindo apresentadores, são cegos

 



O programa 'O Outro Olhar', apresentado por Meri França e Joaquim Gonzales Júnior, vai ao ar semanalmente, ao vivo, a partir desta segunda-feira, às 10h30, no Canal 10 da Super Mídia e pelo site www.tvvotorantim.com.br - Por: Divulgação


Programa de rádio será na Tropical FM, de Votorantim (105,9) - Por: Divulgação


A inclusão de deficientes por meio da comunicação pode ir além da utilização das mídias como espaço de fomento e discussão de práticas de acessibilidade. Com disponibilidade para encarar novos desafios, dividir conhecimentos e vontade de fazer a diferença, é possível que não apenas a notícia, mas todo o fazer comunicacional, seja o próprio suporte de inclusão, como propõe o programa que estreia na segunda-feira, na TV Votorantim Canal 10, chamado de "O Outro Olhar". Semanal e ao vivo, o programa de entrevistas não apenas versará sobre o universo da inclusão das pessoas com as mais distintas deficiências, mas será apresentado e dirigido por uma equipe formada por deficientes visuais, que sempre entrevistará algum deficiente com uma história de superação. Além do programa de televisão, na próxima semana, a versão radiofônica também estreia nas ondas da rádio, com a mesmo ideia, mas formato adaptado.

A ideia do programa não é recente: é fruto de um projeto de fotografia para cegos, realizado pelo jornalista e fotógrafo Werinton Kermes e a semioticista Miriam Cris Carlos. "O projeto e o processo de trabalhar a inclusão através da comunicação já vem de longo tempo e dentro dessas possibilidades de fazer o portador se comunicar, seja das mais diversas formas, procuramos acompanhar e dar acesso às novas tecnologias de comunicação e assim pesquisamos a produção de conteúdos televisivos e radiofônicos para os cegos. Logo percebemos que pouca coisa tem se direcionado a eles no ponto de vista jornalístico, da comunicação mesmo", conta Kermes. O trabalho com os deficientes visuais começou em novembro com 10 cegos totais e cinco com visão subnormal. Kermes e Miriam trataram com o grupo a linguagem televisiva, enquanto o radialista Cacá Martins trabalhou a linguagem radiofônica. "Passamos a trabalhar não apenas as funções de quem está atrás das câmeras ou dos microfones, mas também outras funções, como produção, roteiro, e isso culminou com a necessidade de por tudo o que foi trabalhado em prática", resume Kermes.
A ideia com o programa é apresentar histórias de superação, mas também críticas quanto às dificuldades no que se refere à acessibilidade nas cidades. Para tanto, além de deficientes com histórias inspiradoras de vida, também convidarão secretários e responsáveis pelas cidades para questioná-los sobre o que estão fazendo para melhorar as vias e as calçadas, por exemplo.
Não é a primeira vez que Kermes e Miriam trabalham com inclusão, principalmente com cegos. Já desenvolveram a oficina de fotografia para cegos - com a qual visitaram diversos pontos do país divulgando a iniciativa - e também lançaram, em meados do ano 2006, uma revista de variedades toda em braile. E para o desafio de levá-los para o ambiente da televisão e do rádio, Kermes conta que fizeram apenas pequenas adaptações com roteiro e pauta, que ou é enviada em braile ou gravada e mandada em arquivo para o computador dos apresentadores. Eles também têm um ponto nos ouvidos, mas são dirigidos por outros cegos. A única pessoa que não possui nenhuma deficiência visual é a produtora Érica Domingues. "A ideia é fazer com que a sociedade, os poderes estabelecidos percebam e entendam que em Sorocaba tem um número considerável de deficientes e precisam de atenção do poder público", defende Kermes.

Outra voz

Natural de Apiaí, na região do Alto Vale do Ribeira, Meri França (cega desde que nasceu) será responsável pela apresentação dos programas (de rádio e TV) ao lado de Joaquim Gonzales Júnior, que perdeu a visão em um acidente automobilístico. Muito bem articulada, ela, que durante anos foi casada com um comunicador, conta que dessa relação nasceu, além das filhas, o amor pela comunicação. Mesmo assim, aos 41 anos, conta que jamais se imaginou à frente de um programa de televisão ou de rádio. "Eu sempre convivi no meio da comunicação, e acredito que o deficiente visual sempre gostou de comunicar, temos muita habilidade para a comunicação, e muita curiosidade" defende ela, que nasceu com glaucoma.
Meri reconhece o ineditismo da ação e a importância também, já que poderão expor as dificuldades encontradas no dia-a-dia, contar histórias de superação e esperança, mas principalmente, cobrar frente à população e ao poder público ações efetivas de acessibilidade. "É a primeira vez que estou conseguindo ter voz para realizar alguma coisa, é tudo o que o deficiente quer. Nunca imaginei que estaria fazendo isso", comemora Meri, que está instalada há pouco tempo em Sorocaba, mas já se orgulha das conquistas.

Serviço

O programa vai ao ar semanalmente, ao vivo, a partir desta segunda-feira (25), às 10h30, e poderá ser assistido pelo Canal 10 da Super Mídia e pelo site www.tvvotorantim.com.br e vai ser disponibilizado a outras emissoras comunitárias, através da Acesp (Associação dos Canais Comunitários do Estado de São Paulo) e da ABCCOM (Associação Brasileira de Canais Comunitários). O programa de rádio será veiculado pela Tropical FM, de Votorantim (105,9).

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